CAPITÃO BIROCA X A DESLUMBRADA DA REPÚBLICA

 UM DESAFIO NADA REPUBLICANO


Um conto de Cao Benassi 


(*Esta é uma obra de ficção, qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência) 


Os dias, na conturbada República da Banânia, corriam sem que os bananienses pudessem respirar, em lugar algum, desde as planícies verdejantes da Burocracia aos picos mais elevados da Legislação, algum ar de normalidade. Nesses dias, o que inundava os pobres narizes republicanos, era o fétido odor exalado do Pranalto Central.   

Na ensolarada republiqueta, onde o café era forte e a política mais ainda, dois personagens que ali viviam, tomaram os holofotes, pois mais pareciam saídos de contos de fadas às avessas: o Bonorito, de riso estrondoso, era conhecido por sua peculiar paixão por bolitas de gude, e a Sra. Esbanja, a deslumbrada primeira-dama da república que tinha um gosto um tanto… expansivo, eu diria.

Bonorito, que respondia também por Capitão Biroca, além de falastrão, era um estrategista nato (quando o assunto era a mesa de gude). Havia perdido o pirulito presidencial, que o Supremo Tabacal Fedoral tomou e deu ao Joca, o Sapo Cachaceiro, seu maior desafeto, marido da Esbanja, a Deslumbrada da República, e por isso sonhava em voltar aos tempos áureos, quando seus "amiguinhos" do cercadinho o aplaudiam por qualquer proeza, como o dia em que ele conseguiu equilibrar cinco bolinhas de gude na ponta do nariz. 

Lembrava com saudades e com olhos marejados os dias, nos quais os seus seguidores, fiéis como o chiclete no asfalto quente da Banârnia, gritavam "Mito!" a cada nova manobra de gude. Bonorito, perdido em seus delírios de grandeza, acreditava piamente que governar era como jogar gude: “bastava ter a bolinha certa e empurrar os adversários para fora do círculo”, dizia ele. 

Enquanto isso, a Sra. Deslumbre, usando seus chapéus exóticos e portando joias que a faziam cintilar mais que o sol quando estava a pino na Banârnia, a capital da Banânia, estava em sua saga particular: esbanjar o dinheiro do lesado contribuinte banarniense. Cada viagem internacional, uma nova epopeia de compras. "Precisamos mostrar ao mundo a elegância da Banânia!", vociferava ela, enquanto aterrissava em mais um destino com uma comitiva que parecia um carnaval fora de época. 

Pelas ruas parisienses, ela se encantava com as lojas de grifes, nas quais, segundo os as boas línguas da Banârnia, também conhecida por Jurislândia, (que o Ovo que tudo vê, não veja, ou melhor, não ouça, para não me acusar de fake news), gastou o equivalente ao PIB de uma pequena cidade banarniense em uma única tarde. 

Já em Milão, torrou metade das reservas monetárias do país em sapatos que prometiam fazer seus pés levitarem, mas que, na prática, só faziam o contribuinte arquear até o chão, quão pesada era a impostama para bancar as regalias da Esbanja. O povo da Banânia, acostumado a apertar o cinto, via as notícias das "turnês glamorosas" com uma mistura de incredulidade e… bom, muita paciência.

Um belo dia, num raro momento de tédio entre uma live e outra, Capitão Biroca resolveu propor um desafio à Sra. Esbanja. "Minha cara”, disse ele, enquanto um riso jocoso saracoteava-lhe os lábios, “que tal uma partida de gude? Se eu ganhar, você economiza nas próximas viagens. Agora… se você ganhar, eu te dou uma bolinha de gude de ouro. A que achei no quintal do Palácio!" A Deslumbrada da República, que não recusava um bom desafio (especialmente se envolvesse algo brilhante), não pensou duas vezes e sem titubear, aceitou.

Dizem as boas línguas que a partida foi épica. Bonorito, com sua técnica apurada,  com a precisão de um atirador de elite, que lhe rendera a alcunha de Capitão Biroca, jogava suas bolinhas de gude, levando na mão grande quase todas as bolitas na caçapinha, ganhando ainda as partidas de buração, de peleco e de fubeca. 

A Sra. Deslumbre, por sua vez, estimulada pelo Sapo Cachaceiro, para não fazer feio, tentava arremessar as bolinhas com a mesma maestria de uma minhoca na areia em dia de sol a pino. Para ser justo, com a mesma desenvoltura com que arremessava notas fiscais de suas compras, noutras palavras, sem muita técnica, porém o que não lhe faltava era muita confiança. No final, como esperado, Capitão Biroca venceu.

A Sra. Esbanja, a Deslumbrada da República, com um suspiro dramático e canastrão, declarou: "Ora, Bonorito, suas bolitas são muito escorregadias, mais do que o meu cartão de crédito!" Capitão Biroca, em sua sabedoria (muito circunscrita ao universo do gude), apenas sorriu e disse: "É a experiência, minha cara. A experiência."

E assim, na República da Banânia, ora varonil Jurislânida, enquanto Bonorito continuava seus devaneios de grandeza com suas bolinhas de gude, a Sra. Deslumbre, apesar da "derrota" na partida, continuava sua jornada de deslumbramento, tendo um olho para as futuras promoções e outro no orçamento público banarniense. Afinal, para eles, a grande peça, a Banânia, era apenas um grande tabuleiro de jogo, e o povo, meros espectadores deste teatro chinfrim.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

PESAR, ANO 1, N. 8, AGO, 2024

PESAR, ANO 1, N. 09, SET. 2024

PARA QUE SERVEM OS RETRATOS?!