SONHO NÃO, É REALIDADE!


Eu sei que eu deveria dar sequência ao meu texto "Dor come: uma crônica da dor"! Mesmo com o meu hiperfoco gritando para eu continuar este e outros textos, o contexto me faz, mesmo não gostando e quase não suportando quebra de rotina ou de estrutura, escrever sobre um outro assunto, que está me consumindo. 

Não… não será sobre política! Ainda que os últimos acontecimentos só fizeram meu asco pela corja politiqueira aumentar… esbanja fazendo o que de melhor ela pode fazer, gastar o dinheiro do pagador de imposto com se pequenino ego; lambança na economia, com o Dólar batendo mais R$ 6,00 e me chamando de pobre; governo escarrando na educação e no educador, como sempre… enfim, tudo isso merecia sim um comentário bem ácido, seja lá o que isso signifique!

Mas não… não escreverei sobre política, mas sobre as minhas esquisitices e excentricidades! Não sei dizer o porquê gosto desta palavra: “excentricidade"! Bonita né?! Parece que é coisa chique… grandiosa, pelo menos, era o que eu pensava. No entanto, um certo senhor Aurélio, um belo dia, de um passado não tão distante, me decepcionou. 

Desde pequeno, eu sempre fui uma criança quieta, reservada e que me perdia muito fácil no meu mundinho particular. Nunca gostei muito de interações: me lembro de sair da igreja no meio do culto e ir embora sozinho, pular a janela e chorar embaixo da coberta, pois o barulho do culto me incomodava demais. 

Entre outras esquisitices infantis, eu não estendia a mão para cumprimentar estranhos, olhava para ver quem estava me cumprimentando para responder e meus carrinhos eram todos enfileiradinhos… bonito que só! 

Porém, à medida que eu cresci, é que os prejuízos começaram a aparecer. Aos quinze anos, tive o primeiro episódio de depressão e isso aconteceu porque eu não conseguia fazer as coisas que os meninos da minha idade faziam, tais como ir à cidade em dias de festas, fazer novas amizades, arrumar namoradinhas… 

Sempre tive muita dificuldade em ler as expressões das pessoas, por isto acho que nunca tive sucesso na atividade da conquista amorosa. Nunca consigo perceber quando a pessoa me olha com olhares "diferentes”... acho que nunca flertei com ninguém; se flertasse saberia ler um flerte!

Ir à igreja era um verdadeiro tormento. E por falar em ir à igreja, eu quando pequeno, por volta dos sete anos, ouvia as pregações dos irmãos, que Jesus ia voltar e levar os santos… somente os santos. Como eu sempre fui muito literal e em casa eu ouvia muito, "não faz isto que Deus não gosta!"... entre outras bobagens do tipo, eu tinha minha mãe como santa e eu como um pecador. 

Pois bem! Eu tinha pesadelos terríveis à noite. No sonho, um facho de luz se abria no céu. A terra tremia com o barulho das trombetas e os anjos desciam. Aparecia uma nuvem e o tal Jesus se sentava nela. Minha mãe começava a subir e eu ficava… era um desespero só! Ai que ódio desse Jesus! 

Às vezes, eu me agarrava no pé dela e começava a subir também! Eu ficava tão feliz, que a felicidade parecia ser real… no outro dia, eu podia senti-la como também sentia a dor da tristeza, pois a sandalinha plástica que ela calçava, se soltava do pé dela… os irmãos diziam que a roupa, no arrebatamento iria ficar aqui; e eu caia! 

Bem… voltando a dificuldade com a vida e os prejuízos que foram aparecendo ao longo da minha vida, chamar a atenção de alguém, era sempre um esforço tremendo. 

Preferia sofrer do que dizer não ou chamar a atenção… entre males subjetivos, tinha a descamação das mãos que me trazia muito sofrimento, além das lesões na virilha e noutras partes moles do corpo.

E assim, já que estou embrenhado em meio a tantas confissões, quando me mudei para Cuiabá, tive acesso a tratamentos de saúde… mas não pense que meu suplício acabou: estava apenas começando! Consultórios, médicos, CAPSI, remédios… muitos remédios aos quais sempre fiquei refratário… e muitos diagnósticos!

O primeiro deles foi depressão recorrente. Como a abordagem não funcionou, mudou-se os medicamentos e o diagnóstico para depressão psicótica. Tudo se repetiu… passei a tratar de esquizofrenia; depois de transtorno esquizoafetivo e depois de esquizofrenia de novo; e depois de TAG… enfim, nada resolvia meus problemas. 

Em 2017, fui diagnosticado com artrite reumatóide. Na primeira abordagem, recebi MTX (metotrexato), ao qual fiquei refratário, passando a ser tratado com imunobiológicos, e nesta esteira, fiquei refratário a quatro deles, sendo que um, quase me mandou para o outro lado, se é que existe!

Neste ano (2024), várias lesões (nas virilhas e outras partes íntimas), depois de muito tempo, mais de 20 anos, se me lembro bem, se abriram e minhas mãos descamaram de novo. 

Depois de ter passado por quase todos os dermatologistas do meu plano, fui à uma que me diagnosticou com psoríase o que fez mudar meu diagnóstico de artrite reumatóide para artrite psoriásica. 

Esta foi só uma mudança na minha rotina. Entre tantas outras, teve o falecimento de um colega professor, que me abalou demais, pois ele vivia sozinho e faleceu em casa, sendo encontrado vários dias depois. Detalhe: eu também vivo só!

Neste turbilhão de coisas, comecei a ter mais prejuízos que os que tinha normalmente, como ter só duas amigas e uns poucos irmãos de fé; não socializar; não namorar: esquecimentos, recolhimentos, episódios depressivos e de ansiedade começaram a me acender a luz de alerta. 

Há quase dois meses, depois de várias explosões emotivas, tive um embotamento (shutdown) violento. O sintoma durou mais de um mês com muitos sintomas físicos, extremamente desagradáveis. Corri ao médico: saí do consultório com um encaminhamento para avaliação neuropsicológica. 

Infelizmente, eu não ouvi uma ex-aluna e colega de trabalho que me advertia para o fato de eu apresentar estereotipias e hiperfocos. Mas antes tarde (uns 40 anos de atraso) que nunca, não é?!

Mas o que eu queria contar de fato nesta minha crônica, é que na quinta-feira (5/12/24), de manhã fui levar a Tempestade (minha gatinha) para castrar. Deixei-a na clínica, desci para a academia. Fiz meu treino e fui embora, repassando meu roteiro mental: precisava passar no mercado para comprar carne. Em casa, eu como basicamente carnes com legumes.

Quando cheguei no mercado, bati a mão no bolso e senti a chave do carro: amiguinho… eu tinha esquecido o carro na academia. Isso mesmo: tinha ido embora a pé! 

Dá para acreditar?!


Uma crônica de Cao Benassi


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