PIZZA QUE PARECE TORTA, MAS É FOCACCIA
Uma crônica de Cao Benassi
Com um certo atraso, finalmente esta crônica sai do mundo das ideias.
O atraso para a produção desse meu tipo de texto - que é como menstruação ou como o mensalão do PT (Partido do Trambique), que acontece uma vez por mês - se deu por dois fatores, sendo o primeiro, a influência que a greve geral dos servidores das universidades e institutos federais teve sob a produção da crônica anterior e o segundo, o diagnóstico da Síndrome do Túnel do Carpo (STC) que tive.
Em virtude do acometimento dessa doença, que tem me causado muitas dores - não bastasse a Artrite Reumatóide (AR) - suspendi a continuação dos meus projetos de escrita literária, sendo os mais afetados, as duas "novelas" "Temporada de Caça" e "Condenado: Deus, a igreja e eu", os dois "romances" "Kungannabila" e "O evangelho de Genésio" e vários contos que também estão parados.
Se você, caro leitor, leu as minhas duas crônicas anteriores, você sabe que eu pretendia me lambuzar nas lembranças das comidas de vovó, na segunda produção, porém o contexto vexatório do acordo assinado entre o (des)governo e o (des)comando geral da greve, sem que as bases fossem consultadas - como sempre acontece, e ainda tem gente que acha que não é mero fantoche nas mãos dessa corja - me levou a mexer um pouco, a lama politiqueira do fazendão, embora eu não tenha lá muito traquejo para isso, bem como não tenha também, a mínima disposição, quando o assunto é politiquisse.
Assim, essa atividade ficou para agosto, que é o terceiro mês subsequente a minha decisão de escrever mensalmente um texto com "ares" de crônica. Pode ser que eu, como já disse anteriormente, não tenha muito traquejo com a escrita, pois o meu direito a uma educação pública de qualidade, foi roubado pelos politiqueiros et caterva.
E até hoje, diga-se de passagem, não consegui fazer um curso de gramática da Língua Portuguesa, pois meu salário é surrupiado, mensalmente, à mão grande do Estado: enquanto trabalho doente para garantir meu sustento e o sustento da corja, (politiqueiros et caterva… juízes, principalmente), que deitam e rolam no dinheiro do pagador de impostos - viagens para cima e para baixo; altos salários e toda a sorte de penduricalhos; vinhos, queijos e lagostas caras; conchavos, compadrios e convescotes de toda a sorte, o que muito me revolta.
Bom, como você, caro leitor, já deve ter percebido, este texto vai na contramão dos dois que o antecederam. Não pelo teor, mas pela forma. Nos dois primeiros, eu começo apresentando aspectos da minha infância e só depois, faço uma relação com os infames dias que vivemos… por um lado, pois na vida, tudo é dual, então temos também o lado belo da vida, que está muito distante da politiquisse que infesta a Tupiniquilândia.
Logo, iniciei este texto sentando o sarrafo, algo que amo fazer, mas para não quebrar totalmente a forma das minhas crônicas - não sei se conseguirei manter isso ao longo do tempo, prometo me esforçar para tal - tenho que ao menos tangenciar, sem muito tergiversar, algum aspecto da infância que vivi, entre os pés de amoreiros (cafezal) e na convivência familiar, dos momentos eclesiásticos às mesas fartas embaixo das mangueiras nas datas festivas. E é por aqui mesmo que vou me aconchegando.
Era muito comum, no domingo, principalmente, termos algum prato especial. Mas espere aí… não vá pensando que era algo do tipo "paella", "risoto" ou "sushi", pratos que hoje perpassam minha mesa. Na época, e para aquele contexto, prato especial era sempre um frango com mandioca - que chamávamos de "galinha atolada" -, porco frito guardado na banha em preparações diversas, ou ainda, o bom e velho macarrão.
Cresci num ambiente, no qual a panela cheia era sinônimo de fartura, apesar da pobreza, algo que nunca nos faltou, foi uma panela cheia na beirada do fogão de lenha. Dessa forma, me lembro dos almoços de natal e de ano novo, regados a muito suco Tang, frango ao molho, saladas, arroz e feijão - que aliás, nunca podia faltar -, e as bacias enormes de macarronada… que-de-lí-ci-a! Bons tempos aqueles!
Porém existe algo ainda, que, como as memórias desses "regabofes", que me enchem a boca d'água e me fazem salivar fartamente, preciso abordar neste texto, para que o seu título faça sentido. Esse "algo" é muito mais que especial. Não só pelo sabor, mas também pelas memórias e significados que evoca.
Por falar em significados, nos tempos atuais, estudo um filósofo russo, chamado Mikhail Mikhailovitch Bakhtin (parece nome de remédio… n'é?! - Estou com muita dor de cabeça… espere um pouquinho, vou tomar um comprimido de bakhtin) -, brincadeiras à parte, ele nos diz que quando algo ou alguma coisa, evoca sentidos para além da sua realidade prática, isso se torna um signo ideológico.
Pois para mim, macarronada e focaccia são signos ideológicos… eles me levam para um tempo outro, que não volta mais. Às vezes, cá para nós, devo confessar, que penso: "vou jogar tudo isso pro alto e voltar pra roça"... mas aí vem a voz da razão e me diz: "você não tem uma 'roça' para voltar"!
Vovó Nica (Isabel, já falecida… que o universo a tenha, e… como a tem), fazia nos finais de semana, principalmente, uma espécie de pizza, que era simplesmente deliciosa. Tratava-se de uma massa, parecida à massa de pão, que levava, na receita de vovó, uma cobertura, que, em virtude de nossa pobreza, era sempre de carne moída - a eterna e boa bolonhesa - ou sardinha.
Vovó - eu não sei o porquê, não tive curiosidade de perguntar isso a ela enquanto podia -, chamava o produto daquela receita de "pizza", e para nós, os netos queridos, sempre mais progressistas que os adultos, era a deliciosa "pizza-da-nona". Os adultos, como sempre, mais conservadores, torciam o nariz e dizia que "aquilo podia ser tudo, menos pizza… uma torta, talvez…"
Sempre que vovó Nica fazia as pizzas que pareciam tortas, as divergências surgiam. Polêmicas à parte, todos comiam e "lambiam os dedos"! O tempo passou, e foi necessário passar muito tempo, para que a realidade deixasse de ser a colher na mão do garoto e eu ser o Neo de Matrix me entortando na frente dela.
Xiiiiiiiiii! Que complicou tudo agora, n'é?! Mas se acalme aí, que eu explico melhor!
Pois bem… o tal Neo do filme "Matrix", quando vai procurar o oráculo, ao entrar numa sala, ele encontra um menino, com trajes que lembram vestes monjais, em cuja mão, uma colher se "contorce" mediante ao olhar fixo dele. Porém ao ser questionado sobre o feito, o menino diz que o ato "é simples, pois não há colher".
A colher representa a realidade e isso significa que não há de fato a realidade, mas tão somente uma percepção dela falseada pelos nossos desejos.
Voltando ao caso da pizza que parece torta, apesar das polêmicas em torno da receita de vovó... todos, de um lado os que a admitiam como pizza e de outro, os que diziam que era no máximo, uma torta… e olha lá… a comiam sem que houvesse rejeição e sem que a tal polêmica fizesse alguma diferença na hora de apreciar a iguaria, tal como é hoje a polarização politiqueira do fazendão.
Cá para nós, isso me lembra muito o momento politiqueiro insólito que vivemos atualmente.
Diz a filosofia do Tao Te Ching, que a realidade é a circunstância provisória dos opostos necessários. Neste sentido, é preciso que entendamos que os contrastes são necessários, pois eles nos geram consciência. Não nos esqueçamos também, que em tudo há correspondência: isso é uma lei universal.
Assim, esquerda e direita são necessárias para que a politiquisse do fazendão surja como realidade para a nossa mente. Sem uma delas, não saberíamos o que a outra seria, ou seja, se não existisse a esquerda, não conseguiríamos saber o que é direita e vice-e-versa. Como também não saberíamos o que vem a ser uma democracia: o domínio representativo da maioria em detrimento de uma minoria.
Devemos então elevar nossa consciência com isso, para que entendamos que a alternância no poder de direita e esquerda, é necessária para a criação da circunstância provisória que o Tao Te Ching chama de realidade.
O grande problema, é que a maioria das células que compõe o corpo que chamamos sociedade brasileira, está como o Neo, deslumbrados pela colher se contorcendo nas mãos dos "amos da caverna", e não conseguem perceber que não existe colher nenhuma e quem se contorce, é exatamente quem defronta o tal amo.
Assim é que surge para a mente da maioria a realidade do parece mas não é!
Vamos lembrar o contorcionismo dos globais ao passar pano para o (des)governo e da ministra - aquela de cãs brancas, que as deveria respeitar - do "isso parece censura, é censura, mas eu percebo como democrático: até segunda vale"! Aliás, respeito e idoneidade no grupo dos onze não há nenhum.
Antigamente, no direito consuetudinário, os anciões governavam e julgavam, pois sua condição implicava em sabedoria para tal.
Neste parêntese que abro aqui, vale ressaltar que na Roma antiga, a qualquer sinal de que a sociedade corresse risco, os primeiros a serem protegidos, eram os anciãos, pois caso a sociedade perecesse e precisasse ser recomposta, a sabedoria estaria preservada. Não é o caso de certos anciãos do fazendão. Creio que se a Tupiniquilândia correr perigo, a sociedade empurrará para a destruição, em primeiro lugar, os anciãos do grupo dos onze e os politiqueiros.
Voltando ao fio condutor deste texto, a realidade politiqueira do fazendão, é exatamente como a pizza de vovó, que se parecia com pizza, tinha lá um jeitão de torta, mas que na verdade, era uma focaccia com cobertura. O que passava disso, era tão somente contorcionismo da nossa percepção mental, tentando compreender àquela realidade, sem competências e habilidades para tal.
A receita de vovó era bastante básica: farinha de trigo; fermento natural feito a partir da fermentação de batatas; sal; água morna; banha de porco. Os ingredientes eram misturados formando uma massa espessa, que era posta para descansar e quando dobrava de tamanho, era colocada numa mesa, sovada, colocada numa assadeira, feito pequenos sulcos com as pontas dos dedos, sob os quais se colocava a cobertura.
Somente hoje, de posse de todo meu aprendizado ao longo dos anos que se passaram, deixei de me contorcer na frente da colher. N'outras palavras, compreendi que o que tínhamos como realidade da receita de vovó, era somente uma distorção afetada pelos nossos desejos, ou seja, era uma ilusão. Nem um, nem outro lado do nosso espectro familiar tinha razão sobre aquela realidade.
Hoje é possível avaliar os fatos com maior verossimilhança, do que naquela época.
Hoje tenho acesso às realidades da pizza, da torta e da focaccia, e sem ser tendencioso ou panfletário, é possível falar com maior certeza, que a receita de vovó Nica, que até hoje nos suscita suspiros saudosos e saliva espessa na boca, era uma espécie de focaccia com cobertura.
"Por esse luz que me alomea", como se diz em bom cuiabanez, a massa da base era sim de focaccia.
Olhando para o contexto politiqueiro tupiniquilandez, posso ver se repetindo as cenas da minha infância, com contornos de crueldade a la suplício medieval, é claro. Em nossos regabofes e comilanças roceiras, nunca cancelavámos ninguém - esse cancelar, implica na desumanização do outro - tampouco, alguém saía preso sem acusação, como, tristemente, vemos hoje.
Bom… penso que devo encerrar esse texto por aqui… e não estragar memórias tão significativas com a safadeza, a falta de caráter e de vergonha na cara dos politiqueiros, dos membros do grupo dos onze e da canalha e falecida mídia de massa, que começa a soltar as mãos da caterva.
E não… eu não vou dizer "antes tarde do que nunca"! O que estamos vivenciando, jamais deveria ter acontecido se fossemos um país sério e de gente igualmente séria.
Esses politiqueiros e esses jornalistas passapanistas são maus caráteres, jogam com as circunstâncias e sabem que podem contar com os joguetes da sociedade, ou seja, com um povo ignorante, que os idolatram… sim, não devemos esperar nada além do que fazem, quanto a isso, não há dúvida. Agora, dos togados…
Vergonhoso! Como conseguem, depois de tudo o que está sendo escancarado nos "vazamentos" publicizados pela "Foia do Seu Paulo", que resolveu deixar de fazer a egípcia e agir como jornalistas que são… vir a público e defender o indefensável… esses senhores, se tivessem a mínima decência, deveriam pedir exoneração…
Seria o maior favor que prestariam para a sociedade.
Cao Benassi, 17 de ago. 2024.
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